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SAQUE DO FGTS PARA TRATAMENTO DO AUTISMO

  • Foto do escritor: Lucas Simon
    Lucas Simon
  • 27 de ago. de 2021
  • 5 min de leitura

Atualizado: 12 de out. de 2023



Meu filho é autista, posso sacar o FGTS para custear o tratamento? A resposta é sim, por força do princípio da dignidade da pessoa humana.


A Lei 8.036/90 estabelece e dá diretrizes sobre o Fundo de Garantia do Tempo de Serviço (FGTS), e entre as informações ali contidas, existe um rol (uma lista, por assim dizer) de situações em que o trabalhador poderia fazer o saque do valor depositado na conta da Caixa, por exemplo em casos de demissão sem justa causa, idade igual ou superior a setenta anos, necessidade pessoal, cuja urgência e gravidade decorra de desastre natural, entre outros.


O FGTS é uma garantia que o Estado concede ao trabalhador, e essa garantia tem finalidades, sendo uma delas a de permitir ao trabalhador que faça uma reserva financeira (o depósito do FGTS), para fazer uso dela em uma determinada emergência, como em um desses casos que citei acima.


E a segunda é de caráter social, ou seja, o papel de garantir o básico estipulado pela Constituição Federal, como a educação, a saúde, o trabalho, o lazer, a segurança, a previdência social, a proteção à maternidade e à infância, e a assistência aos desamparados. Nesse sentido é que essa segunda finalidade visa assegurar recursos para ações governamentais voltadas ao financiamento de habitação popular, saneamento básico e infraestrutura urbana.


É por causa dessas garantias que o Estado precisa assegurar que o cidadão tenha um valor financeiro garantido para esses fins. E é em razão disso que o saque do FGTS não é exercido de forma livre, mas somente em situações específicas que estejam previamente previstas na lei.


Sabendo disso, eu reafirmo: o saque dos valores do FGTS somente é possível dentro daquelas possibilidades previstas em lei, só que nenhuma dessas possibilidades prevê o saque para custeio de tratamento de depende que tenha autismo. O que fazer nesse caso?


Um pai entrou com uma ação judicial contra a Caixa Econômica Federal para sacar o valor depositado na conta do FGTS, a fim de custear o tratamento prescrito por médico especializado, para seu filho que é acometido de Transtorno do Espectro Autista (CID 10 - F84.0), retardo mental (CID 10 - F72.1) e transtorno de hiperatividade (CID 10 - F90.0) — a ação somente foi necessária por a Caixa recusou o pedido de saque.


O Superior Tribunal de Justiça (STJ) entende que o rol (a lista) de situações que permitem o saque é meramente exemplificativo. Isso quer dizer que a lei prevê situações em que o saque é liberado, mas não limita o seu alcance, o rol somente existe para dar balizas mínimas do alcance da lei.


Isso acontece porque o princípio da dignidade da pessoa humana, previsto no art. 1°, III, da Constituição Federal, representa um dos fundamentos basilares do Estado Democrático de Direito, isso quer dizer que a todos deve garantir seus direitos, e promover a desigualdade somente para igualar quem for desigual — eu dei um melhor exemplo disso nesse outro post aqui.


A juíza que julgou o caso disse o seguinte no processo:


E assim é porque o princípio da dignidade da pessoa humana, consagrado no artigo 1°, III, da Constituição Federal de 1988, representa um dos fundamentos basilares do Estado Democrático de Direito, devendo refletir sobre todos os documentos legislativos voltados para fins sociais, como é o caso da lei que instituiu o Fundo de Garantia do Tempo de Serviço.

Ou seja, agora que sabemos que o FGTS existe também por conta do princípio da dignidade da pessoa humana, e é valor que pertence ao trabalhador, parece justo que o proprietário dos valores depositados na conta do Fundo de Garantia possa retirá-lo para proporcionar tratamento de saúde e melhor qualidade de vida para seu dependente.


Posso sacar o FGTS mesmo tendo plano de saúde?


Já sabemos também que quando se trata de plano de saúde, a operadora do plano não pode se negar a dar cobertura para o tratamento do paciente autista ou sequer limitar o número de sessões necessárias ao adequado tratamento, tendo em vista que a única pessoa que pode e tem o dever de prescrever a quantidade de sessões é o médico assistente que acompanha a pessoa.


O que acontece é que o contrato de plano de saúde geralmente prevê que o alcance da cobertura de tratamento se dá na medida mínima estabelecida pela ANS e pela Lei 9.656/98. A ANS estabelece uma quantidade mínima para tratamentos, e é nessa disposição que as operadoras se ancoram para limitar o número de sessões anuais para tratamento do portador do autismo.


Em decisões judiciais, quando a operadora do plano limitava o número de sessões de terapia que daria cobertura, ainda que o médico tivesse indicado um número maior, havia a necessidade de ingressar com uma ação judicial para que o plano fizesse cobertura total das sessões. Todavia, como o contrato firmado trazia a disposição de “cobertura mínima, conforme rol da ANS”, o juiz determinava que as sessões que extrapolassem a cobertura mínima fossem custeadas em parte pelo responsável do plano e em parte pela operadora (independente se o plano fosse participativo ou integral).


Contudo, a ANS editou no dia 12 de julho de 2021 o Comunicado n. 92, informando às operadoras de planos de saúde que não há mais limitações de sessões para os tratamentos do portador de autismo.


Os contratos geralmente estabelecem no capítulo das “Coberturas e Procedimentos Garantidos” que a cobertura se dá dentro dos limites estabelecidos pela ANS (ainda que em desencontro com o entendimento jurisprudencial e a lei reguladora), mas como não mais existe uma cobertura mínima para esses procedimentos/tratamentos, não mais existe a justificativa para a operadora. A obrigação de cobrir o tratamento passa a ser integral e irrestrita — respeitado o seu contrato, se for de coparticipação, a cobertura e o pagamento serão da mesma maneira.


Sabendo que as operadoras sempre foram obrigadas a cobrir todo o tratamento, com base no artigo 10 da Lei n. 9.656/98 — aliás isso já foi há muito decidido em recurso repetitivo pelo STJ, quem estava errada e atrasada era a ANS — agora existe esse comunicado da ANS que obriga as operadoras a dar cobertura a quantas sessões forem necessárias.


COMUNICADO Nº 92, DE 9 DE JULHO DE 2021

A Diretoria Colegiada da Agência Nacional de Saúde Suplementar - ANS, no uso das atribuições que lhe confere o inciso VI do art. 30, da Resolução Regimental nº 01, de 17 de março de 2017, considerando a decisão proferida na 553ª Reunião de Diretoria Colegiada, contida no processo SEI nº 33910.021068/2021-51, COMUNICA para todas as operadoras de planos de saúde que não há mais as limitações de número de sessões previstas nas Diretrizes de Utilização - DUT dos procedimentos SESSÃO COM PSICÓLOGO E/OU TERAPEUTA OCUPACIONAL e SESSÃO COM FONOAUDIÓLOGO, reforçando que os procedimentos que envolvem o atendimentos por FISIOTERAPEUTAS, tais como REEDUCAÇÃO E REABILITAÇÃO NO RETARDO DO DESENVOLVIMENTO PSICOMOTOR, REEDUCAÇÃO E REABILITAÇÃO NEUROLÓGICA e REEDUCAÇÃO E REABILITAÇÃO NEURO-MÚSCULO-ESQUELÉTICA já se encontram previstos no rol vigente sem nenhuma limitação de número de sessões, sendo, portanto, obrigatória a sua cobertura em número ilimitado, uma vez indicados pelo médico assistente, para todos os beneficiários de planos regulamentados, portadores do Transtorno do Espectro Autista – TEA

Dessa forma, se você não tem plano de saúde e precisa sacar o FGTS para custear o tratamento de forma particular, existe essa possibilidade de pleitear pelo seu direito ao saque. O saque do FGTS é igualmente permitido para você que tem plano de saúde mas precisa pagar sessões excedentes, em outros casos e terapias que ainda tenham coberturas mínimas e a você cabe arcar com os custos das sessões que extrapolam a cobertura dada pelo contrato.



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Caso você prefira um contato mais próximo e me contar o seu caso, me envie um e-mail no endereço: lucassimon.adv@gmail.com


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